O entendimento sobre a anatomia do corpo suscitou algumas discussões e estudos através dos tempos históricos. Este transcurso correspondeu a uma disposição de pensamento tutelada pelas pesquisas e motivada pela curiosidade dos fenômenos da natureza e sua relação com o ser humano.
Para Gustavot Diaz, no estudo “Da Anatomia Medieval à Anatomia Moderna – Um pequeno ensaio a partir de Rembrandt” (2009), a anatomia na Europa durante o movimento renascentista conduzia à própria superação das tradições clássicas, que se apresenta como panorama, não apenas de rupturas, mas de contiguidades e repetições.
Os avanços nessa área de conhecimento, até então, era mal estruturada, demandando a desconstrução e a reinvenção de muitos processos, mecânicos e filosóficos, o que perpassou pela anatomia proposta por de Galeno, referente à Idade Média aos tempos idos de Andreas Versalius – mestre de Leonardo da Vinci.
Neste texto imagético, a intenção é ver a anatomia da mulher grávida, na perspectiva de Da Vinci, trata-se do desenho denominado ‘O Útero’. O desenho foi confeccionado à pena e tinta, e esboça o útero com o feto. Dentre seus rabiscos, o olhar do espectador é conduzido à imagem maior, localizada na altura do centro da página do lado esquerdo. O desenho do útero mostra as três camadas de tecido uterino e as irrigações sanguíneas, que poderiam ser identificadas como os vasos sanguíneos. Além disso, ele possibilita visualizar a estrutura externa, que pode ser entendida como a placenta, com localização diferente daquela que se consegue hodierno. O feto está representado com braços e pernas flexionados, cabeça fletida, em posição pronada e visualização de parte do cordão umbilical, o que conduz a verossimilhança de que durante a dissecção o feto se encontra-se como relatado no texto imagético, considerando a lógica adotado por ele na confecção de vários desenhos oriundos de seus estudos nesta perspectiva.

Imagem: O feto no Útero (1512)
Em torno do desenho central, identificam-se os esboços das camadas teciduais do útero, entendidas como as vilosidades. Parâmetros celulares, composições anatômicas simétricas, e também o registro de possíveis anotações oriundas da dissecção de um corpo gravídico.
Sob outra lente, a autora da obra “Figurações do Corpo Feminino”, Maria do Sameiro Barroso (2010), verificou que, Leonardo Da Vinci ao desenhar as artérias uterinas com os ramos cérvico‑vaginais e demonstrar que o útero é constituído por uma cavidade única, e o feto dentro na cavidade, conferiu a representação forma realista, mostrando o que seria as membranas fetais e a placenta, fazendo dele o artista fundador da iconografia anatômica.
Com este detalhamento de parte do corpo feminino, Leonardo Da Vinci se mostrou a frente se seu tempo ao desenhar a anatomia de forma rebuscada do útero. Isto provavelmente foi possível em virtude da influência dos pensadores humanistas e textos gregos descobertos sobre a anatomia conhecida no período do movimento renascentista, que influenciaram a igreja a aceitar a dissecação dos corpos humanos.
O entendimento sobre o desenho, dentro das possibilidades da modalidade textual, foi possível identificar os refinamentos rebuscados mostrado no desenho do útero gravídico de autoria de Leonardo da Vinci no que tange o realismo expressado durante o movimento à época e a relação estabelecida entre o feto e o útero feminino, contraditória às relações estabelecidas pela sociedade durante o movimento renascentista.
Referencias
BARROSO, M. S. Figurações do corpo feminino do século XV ao século XVIII. In: CARDOSO, A., OLIVEIRA, A. B., MARQUES, S. M. Arte Médica e Imagem do Corpo: de Hipócrates ao final do século XVIII. [catálogo]. Lisboa, 2010.
DIAZ, G. Da Anatomia Medieval à Anatomia Moderna – Um pequeno ensaio a partir de Rembrandt”, 2009.